domingo, 6 de outubro de 2013

Os outros

Ontem fui ao cabeleireiro. Deparei-me com uma cena triste. Daqueles episódios pobres de espírito. Um jovem entrou, cumprimentou os presentes e dirigindo-se ao cabeleireiro disse que pretendia cortar o cabelo a direito. As miudinhas que se encontravam em seu redor começaram a opinar: “não se usa”… “vai-te ficar mal”… “porque não fazes o corte do actor X”…”faz antes tipo surfista”… não pararam...
Resultado, o jovem acabou por dizer que estava inseguro e que voltava noutro dia! Muito bem, pensei. Tanto se meteram que perderam o cliente! Espero que assim seja, apesar de saber que o mais provável é o jovem mudar o corte só porque os outros acham melhor…

 Pergunto-me porque razão as pessoas acham que podem invadir a privacidade dos outros? Se alguém emagrece, “estás mais magro, que dieta estás a fazer”? Se engorda, “então, desleixaste-te”?  E quanto à roupa é uma festa:” oh João essas calças ficam-te mal atrás”… “onde compraste esse vestido tão atrevido, também estou a precisar dum”…
Mas seremos todos infantilóides ao ponto de não percebermos onde terminam as fronteiras da privacidade? Não é por se conhecer uma pessoa que se é íntimo. Para tal, é preciso que a outra nos dê essa abertura, esse espaço. Mesmo que seja família há grandes limitações - a família é algo que nos acontece não somos nós a escolher. Ser parente não é ser íntimo. O respeito conquista-se e a intimidade constrói-se. Nada é garantido só porque respiramos o mesmo ar!
Se emagrecer ou engordar, se a roupa me fica bem ou mal, se o cabelo está curto ou comprido, isso é comigo. Aprendam a respeitar o próximo. O vosso gosto não é o dos outros. E a carneirada da moda, que não tem gosto próprio e por isso faz o que lhe dizem que se usa, arranjem uma vida e deixem a dos outros.
O meu corpo é meu, não é nosso.
E por favor, não digam tudo o que pensam. Os vossos pensamentos não são sabedoria, são apenas pensamentos. Porque razão acham que são peritos do que quer que seja? Ainda por cima, sem vos ser pedido.
E por favor parem com a idiotice do “não faz mal porque toda a gente faz”. Sim, toda a gente tontinha faz. E que tal colocarem-se na pele dos outros para sentirem se toda a gente devia fazer? Ou fazem-no por vingança? Mediocridade!
Bem sei que também há gente que tudo o que faz mostra aos outros. E que espera comentários construtivos. Não sabem viver sem a aprovação da maioria. O aspecto tem de ser apreciado… mas porquê? Porque não se bastam a si mesmo? Como não gostam do que são precisam que lhes digam que podem gostar de si mesmos? Ai, que confusão de viver.
Não é exercício difícil o do bom conviver. Ou deveria dizer, o de bem viver? Eu conheço-me. Olho ao espelho e gosto do que vejo. Construo a minha vida segundo o que considero correcto. Alcanço o que posso alcançar. Analiso o meu ser. Entendo as minhas limitações. Conheço o meu corpo e a minha mente. Logo, dou espaço aos outros, pois também quero que me dêem espaço… Respeito para ser respeitado!
Tal como o espaço físico deve ser respeitado. Para quem não sabe, não nos devemos aproximar de uma pessoa menos de 50 cm se não formos íntimos. Por isso, numa fila de espera de transportes, num balcão de atendimento, na conversa com conhecidos não se colem!  E parem de bater no braço quando estão a conversar com alguém - procurem um psicólogo que vos ajude a controlar o tique!
O problema é que maior parte das pessoas não sabe o que é ser íntimo. Que pena, deve ser muito triste… viver sem saber o que é ter alguém de quem se sentem íntimos para que possam perceber a diferença.
E por vezes podem até ser muito ofensivos. Lembro-me de duas situações extremamente estúpidas. Uma de um senhor que estava a fazer tratamentos de radioterapia, que foi abordado por uma vizinha que o chamou à atenção “porque quem tem cancro não devia ir para a praia apanhar escaldões” – o qual lhe respondeu “a vizinha deve ser parva, estamos em Dezembro! E a pele está queimada devido ao tratamento”; e outra situação de uma miúda que a chorar respondeu à mãe da amiga, que a repreendeu por ter as calças muito puídas: “os meus pais estão desempregados”.

A minha saudosa avó costumava perguntar: “Onde estava esta gente quando O Senhor distribuiu a inteligência?”

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