Ontem fui ao cabeleireiro. Deparei-me com uma cena triste. Daqueles
episódios pobres de espírito. Um jovem entrou, cumprimentou os presentes e
dirigindo-se ao cabeleireiro disse que pretendia cortar o cabelo a direito. As miudinhas
que se encontravam em seu redor começaram a opinar: “não se usa”… “vai-te ficar
mal”… “porque não fazes o corte do actor X”…”faz antes tipo surfista”… não pararam...
Resultado, o jovem acabou por dizer que estava inseguro e
que voltava noutro dia! Muito bem, pensei. Tanto se meteram que perderam o
cliente! Espero que assim seja, apesar de saber que o mais provável é o jovem
mudar o corte só porque os outros acham melhor…
Pergunto-me porque razão as pessoas acham que podem invadir
a privacidade dos outros? Se alguém emagrece, “estás mais magro, que dieta estás
a fazer”? Se engorda, “então, desleixaste-te”? E quanto à roupa é uma festa:” oh João essas
calças ficam-te mal atrás”… “onde compraste esse vestido tão atrevido, também
estou a precisar dum”…
Mas seremos todos infantilóides ao ponto de não percebermos
onde terminam as fronteiras da privacidade? Não é por se conhecer uma pessoa
que se é íntimo. Para tal, é preciso que a outra nos dê essa abertura, esse
espaço. Mesmo que seja família há grandes limitações - a família é algo que nos acontece não somos nós a escolher. Ser parente não é ser íntimo. O respeito conquista-se e a
intimidade constrói-se. Nada é garantido só porque respiramos o mesmo ar!
Se emagrecer ou engordar, se a roupa me fica bem ou mal, se
o cabelo está curto ou comprido, isso é comigo. Aprendam a respeitar o próximo.
O vosso gosto não é o dos outros. E a carneirada da moda, que não tem gosto próprio
e por isso faz o que lhe dizem que se usa, arranjem uma vida e deixem a dos
outros.
O meu corpo é meu, não é nosso.
E por favor, não digam tudo o que pensam. Os vossos
pensamentos não são sabedoria, são apenas pensamentos. Porque razão acham que são
peritos do que quer que seja? Ainda por cima, sem vos ser pedido.
E por favor parem com a idiotice do “não faz mal porque toda
a gente faz”. Sim, toda a gente tontinha faz. E que tal colocarem-se na pele
dos outros para sentirem se toda a gente devia fazer? Ou fazem-no por vingança?
Mediocridade!
Bem sei que também há gente que tudo o que faz mostra aos
outros. E que espera comentários construtivos. Não sabem viver sem a aprovação
da maioria. O aspecto tem de ser apreciado… mas porquê? Porque não se bastam a
si mesmo? Como não gostam do que são precisam que lhes digam que podem gostar
de si mesmos? Ai, que confusão de viver.
Não é exercício difícil o do bom conviver. Ou deveria dizer,
o de bem viver? Eu conheço-me. Olho ao espelho e gosto do que vejo. Construo a
minha vida segundo o que considero correcto. Alcanço o que posso alcançar.
Analiso o meu ser. Entendo as minhas limitações. Conheço o meu corpo e a minha
mente. Logo, dou espaço aos outros, pois também quero que me dêem espaço… Respeito
para ser respeitado!
Tal como o espaço físico deve ser respeitado. Para quem não
sabe, não nos devemos aproximar de uma pessoa menos de 50 cm se não formos íntimos.
Por isso, numa fila de espera de transportes, num balcão de atendimento, na
conversa com conhecidos não se colem! E
parem de bater no braço quando estão a conversar com alguém - procurem um psicólogo
que vos ajude a controlar o tique!
O problema é que maior parte das pessoas não sabe o que é
ser íntimo. Que pena, deve ser muito triste… viver sem saber o que é ter alguém
de quem se sentem íntimos para que possam perceber a diferença.
E por vezes podem até ser muito ofensivos. Lembro-me de duas
situações extremamente estúpidas. Uma de um senhor que estava a fazer
tratamentos de radioterapia, que foi abordado por uma vizinha que o chamou à
atenção “porque quem tem cancro não devia ir para a praia apanhar escaldões” – o
qual lhe respondeu “a vizinha deve ser parva, estamos em Dezembro! E a pele está
queimada devido ao tratamento”; e outra situação de uma miúda que a chorar
respondeu à mãe da amiga, que a repreendeu por ter as calças muito puídas: “os
meus pais estão desempregados”.
A minha saudosa avó costumava perguntar: “Onde estava esta
gente quando O Senhor distribuiu a inteligência?”